segunda-feira, novembro 12, 2007

Condição Humana

Seria perfeito se pudessemos prometer e cumprir a promessa de não magoar o outro. Mas, infelizmente, é inerente aos seres humanos o fato de não sabermos amar, como diria Nelson Rodrigues.

Condição Humana
Linox

Desculpe!
Mas não posso prometer
Que eu nunca vou
Te machucar
Porque!
Sob a dura
Condição Humana
Vivemos eu e você
Como sempre foi

Todo dia, um novo dia...
Eu sei que mal
A gente se juntou
E já mudou
No modo de pensar
E o medo de mudar assusta
Eu sei!
E custa a aliviar
Mas não há de ser

Mais forte que um novo dia...
Afinal!
Tudo aconteceu
De repente
Num sinal!
Era tudo
Tão diferente...

O amor chegou
E eu cheguei prá você
Você me olhou
E a gente pagou prá ver...

Desculpe!
Mas não posso prometer
Que eu nunca vou
Te machucar
Porque!
Sob a dura
Condição Humana
Vivemos eu e você
Como sempre foi
Todo dia, um novo dia...



E se eu não for do jeito

Que espera que eu seja

Não veja isso

Como uma coisa ruim

Assim as nossas diferenças

Jamais serão nosso fim...



Afinal!Tudo aconteceu

De repenteNum sinal!

Era tudo

Tão diferente...



O amor chegou

E eu cheguei prá você

Você me olhou

E a gente pagou prá ver

E a gente pagou prá ver

Poema

Essa é uma música que o cazuza compôs pouco antes de morrer, tem uma linda melodia, que foi acertada pelo Frejat e teve a letra composta pelo Ney Matogrosso. Por sinal, uma das letras mais lindas que já ouvi.

Poema
Música: Cazuza e Frejat Letra: Ney Matogrosso

Eu hoje tive um pesadelo e levantei atento a tempo
Eu acordei com medo e procurei no escuro
Alguém com seu carinho e lembrei de um tempo
Porque o passado me traz uma lembrança
Do tempo que eu era criança
E o medo era motivo de choro
Desculpa pra um abraço ou um consolo
Hoje eu acordei com medo, mas não chorei
Nem reclamei abrigo
Do escuro, eu via um infinito sem presente
Passado ou futuro
Senti um abraço forte, já não era medo, era uma coisa sua que ficou em mim, que não tem fim
De repente a gente vê que perdeu
Ou está perdendo alguma coisa
Morna e ingênua
Que vai ficando no caminho
Que é escuro e frio, mas também bonito
Porque é iluminado
Pela beleza do que aconteceu
Há minutos atrás

sexta-feira, novembro 09, 2007

Tristeza não tem fim

Em meio ao meu ócio produtivo, atordoada pela culpa pós-moderna da produtividade, e tentada eternamente pela preguiça como estilo de vida, lia um texto da coluna do Caversan na Folha, quando a ingrata angústia tomou conta do meu ser.


Você, meu caro único leitor amigo, questiona-se qual é minha nova angústia internalizada. Mas não se preocupe que não farei segredo.


O objeto da minha angústia foi a conclusão desse artigo: “Afinal uma tristeza que aparentemente não tem fim, pode ser apenas uma dor-de-cotovelo. Em vez de Prozac, talvez precise de um bom e novo amor.”


Será?


Tristeza não tem fim/ Felicidade sim
("A Felicidade", de Tom Jobim e Vinicius de Moraes)


Nascemos para perseguir a borboleta de asas de fogo. Se não a pegamos, seremos infelizes, e se a pegamos, lá se nos queimam as mãos.
(Monteiro Lobato em "A Barca de Gleyre)


Tire o seu sorriso do caminho que eu quero passar com a minha dor
("A Flor e O Espinho", de Nelson Cavaquinho e Guilherme de Brito)

Bom dia tristeza
Que tarde tristeza
Você veio hoje me ver
Já estava ficando até meio triste
De estar tanto tempo longe de você
Se chegue tristeza
Se sente comigo
Aqui nesta mesa de bar
Beba do meu copo
Me dê o seu ombro
Que é para eu chorar
Chorar de tristeza
Tristeza de amar
("Bom Dia Tristeza", de Vinícius de Moraes e Adoniran Barbosa )

O inferno são os outros

João Pereira Coutinho, 31, é colunista da Folha. Reuniu seus artigos para o Brasil no livro "Avenida Paulista" (Ed. Quasi), publicado em Portugal, onde vive. Escreve quinzenalmente, às segundas-feiras, para a Folha Online.
da Folha Online

Não uso relógio. Nem sequer para despertar. Despesa inútil. Os meus vizinhos tratam do assunto por mim, todos os dias, nos sete dias da semana. Mudei de casa uns meses atrás e fiquei abismado com a pontualidade dos bichos. Comecei por tirar apontamentos. Interesse científico, não mais. Hoje, conheço a rotina deles, e a minha, que recito de memória como os Gregos Antigos recitavam as canções de Homero.

Durante a semana, tudo começa com o vizinho de cima que usa o banheiro às seis da manhã. A mulher usa às seis e quinze. Sei distinguir os gêneros pelo fluxo urológico: intermitente, o dele; contínuo, o dela. Problemas de próstata, aposto. Depois, a água do lavatório corre, ele provavelmente faz a barba. Não sei quem usa o secador. Pela expressão industrial do som, é ela. A julgar pela dimensão do penteado, que me assaltou certo dia no elevador, é definitivamente ela. Às sete, abrem a porta do apartamento. Usam as escadas (de manhã), porque é mais rápido. Ela fala muito. Ele não fala nada. The end?

Longe disso. É pelas sete que os vizinhos do lado continuam a sinfonia inacabada. Confesso que não são tão pontuais como os vizinhos de cima. Às vezes, com indisfarçável preguiça, acordam às sete e dez, sete e quinze; depois acordam as crianças, dois anjos que começam imediatamente a destruir a casa e as minhas últimas réstias de sanidade. Das sete e vinte às oito e pouco, os pais tomam banho; os filhos já tomaram na noite anterior e aproveitam a ausência dos pais para deitar fogo à casa.

Brinco. Ou quase. Os desenhos animados passam agora na TV com potência sonora que daria para alimentar um estádio. O prédio treme. Perante o excesso, a mãe grita com os filhos. Os filhos, num belo retrato da educação moderna, gritam com a mãe. Aposto que batem na mãe. E eu, como qualquer cinéfilo amador perante as torpezas do vilão, pergunto com unhas roídas: "E o pai? Onde está o pai, meu Deus?"

O pai entra em cena, acaba com a discussão e, pela violência dos tapas, acaba com os filhos. São segundos de silêncio, segundos de suspense, quebrados finalmente pelo choro das crianças, que começa em crescendo, como nas aberturas de Wagner. Fenômeno fascinante: elas nunca choram ao mesmo tempo. A orquestra está suficientemente afinada para que uma avance quando a outra se cansa. Às oito e meia, a família abandona o lar. Aplausos, aplausos.

Tenho duas horas de descanso. Até as dez e meia, altura em que o vizinho de baixo entende ser seu dever moral contribuir para a minha educação nas áreas do metal, trash, black metal, doom metal e manicômio metal. Em matéria de radioatividade, não há diferenças entre Lisboa e Chernobyl. Pelas onze, avançam os Sepultura. Pelas onze e dez, eu peço para ser sepultado. E começo a redigir o meu testamento para o caso de me encontrarem na banheira, o único sítio da casa onde posso dormir e até escrever sossegado. Como Vinicius de Moraes, sim, que seguramente tinha vizinhança igual.

Pena que a banheira nem sempre resulte: aos fins-de-semana, por exemplo, os meus vizinhos aproveitam as manhãs livres para fazerem o que Adão e Eva começaram depois do episódio da maçã. O meu banheiro, não perguntem por que, amplifica as intimidades.

Os de cima são silenciosos e rápidos. Em dez minutos, e como diria Glauber Rocha, é a terra a transar. Das onze às onze e dez, existe uma cama e existe o triste ranger da cama. Não trocam palavra. Ou trocam - mas eu não consigo ouvir. Pena. Quando a água chapinha no bidé, sabemos que a paixão também corre pelo cano. Até ao sábado seguinte.

Mas estranho são os vizinhos do lado. Com duas crianças, eles conseguem repetir a dose e a senhora leva o prêmio Meg Ryan da Semana. Com a diferença de que Meg Ryan fingia o orgasmo. Aqui, não, violão. É impossível, humanamente impossível, fingir uma coisa destas: gritos sincopados, como a sirene de uma ambulância, que termina com um vigoroso rugido selvático, na melhor tradição Metro-Goldwyn-Mayer.

Felizmente, o amor do vizinho de baixo pelo rock metálico já o deixou surdo há muito para os chamamentos de Cupido. Nenhum sexo por aquelas bandas. Exceto se o ladrar do cão, que se prolonga por 24 horas, for a cobertura perfeita para um verdadeiro Casanova dos infernos. Prometo investigar.

A dúvida é inevitável: chegou o momento de eu trocar de casa? Não creio. Não apenas porque o cenário seria provavelmente pior, ou igual. Mas porque existe em toda esta sinfonia um fundo familiar, e até teatral, que simplesmente me encanta. Teatral? Nem mais. Deitado na escuridão da cama e com o sono desfeito em farrapos, eu sou uma espécie de encenador por antecipação, que dá ordens mentais aos meus atores privados.

"Correr a água."

Eles correm a água.

"Bater nas crianças."

Eles batem nas crianças.

"Rugir como um leão."

Rrrrrrrrrrrrrrr...

Além disso, seria duvidoso que eu encontrasse em qualquer outro bairro da cidade leitores desta "Folha" tão fiéis como os vizinhos de cima, de baixo e do lado.